Movimentos Sociais no Brasil
Os avanços
observados em alguns momentos da história do Brasil, no âmbito econômico,
social e político, estiveram sempre associados aos interesses do capitalismo
internacional. A emancipação política em 1822 e a abolição da escravatura em
1888, por exemplo, foram plenamente compatíveis com a expansão inglesa no
mercado mundial; a industrialização do país, a partir de 1930, esteve
diretamente associada à crise do capitalismo no período entre guerras; e o
golpe militar de 1964 deve ser relacionado às necessidades de expansão
oligopolista. Isso significa dizer que o papel do Brasil na divisão
internacional do trabalho foi sempre de subalternidade em relação aos países
centrais.

OS
MOVIMENTOS SOCIAIS NA REPÚBLICA E A CIDADANIA
Já no primeiro
governo da República, o presidente, marechal Deodoro da Fonseca, desrespeitou a
Constituição que acabara de ser promulgada e dissolveu o Congresso. Esse fato é
ilustrativo do caráter autoritário da sociedade brasileira e, em especial de
suas elites governantes.

Canudos tem
sua importância destacada não apenas pelas derrotas sucessivas que impôs às
expedições militares, mas também pelo exemplo de um povo rude, criado na
miséria do sertão nordestino e oprimidos pelos senhores de terras e pela
natureza, que sob a liderança de Antônio Conselheiro, construiu uma comunidade
sem polícia e sem impostos, onde todos trabalhavam e a produção era distribuída
conforme as necessidades de cada um.
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Miliares da República |
Movimento semelhante foi o Contestado
(1912-1916), na divisa do Paraná com Santa Catarina. Expulsos das terras que
foram cedidas ao grupo americano Percival Farguhar para a construção de uma
estrada de ferro, os caboclos resistiram a essa medida construindo vilas onde
se vivia em igualdade e onde se lutava pela terra. Uma carta encontrada no
bolso de um caboclo morto dizia: “Nóis não tem direito de terra, tudo é para as
gentes da Oropa”.
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Caboclos do Contestado |
A luta pela
terra não decorre apenas da necessidade de se conquistar um pedaço de chão para
trabalhar, mas também da necessidade de se conquistarem direitos e de fazer com
que as leis expressem esses direitos e sejam respeitadas.
Uma questão
importante sobre a cidadania é que ela não se refere apenas ao gozo dos
direitos – direito de satisfazer as necessidades tendo acesso aos bens
socialmente produzidos, direito de dispor do próprio corpo, de locomover-se, de
manifestar-se livremente e de decidir sobre a própria vida -, mas também ao
dever de exercê-los. A cidadania implica o respeito ao direito dos outros, o
que parece óbvio e simples, mas não é, uma vez que pressupõe o reconhecimento
da diversidade, vivenciada na relação conflituosa com os outros, na qual o
direito e o dever estão intimamente associados.
O
MOVIMENTO OPERÁRIO E A LUTA POR DIREITOS

Os sindicatos
surgiram, nos primeiros anos do século, influenciados pelas ideias anarquistas
trazidas pelos imigrantes europeus e que marcariam o movimento operário de
forma majoritária até o início dos anos 20.
Desde o início
do século, a mobilização e a organização operária foram intensas.
Sintomaticamente, naqueles anos dois fatos externos refletiram na vida
brasileira. De um lado, a breve recessão provocada pela Primeira Guerra
Mundial, trazendo a diminuição do emprego e o achatamento salarial. Do outro, o
êxito obtido pela Revolução Comunista de 1917, na Rússia, que trouxe a
perspectiva de uma revolução proletária no Brasil. O movimento operário na
Primeira República foi marcado por muitas lutas, porém, as reivindicações eram
sempre as mesmas, devido ao limitado avanço no campo das conquistas obtidas e a
pouca mudança em relação ao quadro de opressão a que estavam sujeitos os
trabalhadores dentro das fábricas.
No final dos
anos 20, entretanto, o movimento operário voltaria a crescer, dessa vez sob a
influência dos comunistas, que passariam a exercer a hegemonia no movimento
operário em diante, ampliando o seu raio de ações, ao abranger questões
políticas a partir da articulação com os partidos de esquerda – Partido
Comunista do Brasil (PCB) e Partido Socialista do Brasil (PSB).
Todavia, o
crescimento verificado no movimento operário foi barrado pelas reformas
promovidas a partir da Revolução de 1930. A mudança do eixo econômico, de
agrário para industrial, com o Estado à dianteira, implicou a
institucionalização das relações entre capital e trabalho, com definição, por
exemplo, da jornada de trabalho de 8 horas diárias, do salário mínimo, da
organização sindical, etc., questão que passaria ao controle do Ministério do
Trabalho, Indústria e Comércio.
Assim, ao
mesmo tempo em que o Estado atendia às reivindicações que os operários já
vinham fazendo desde o início do século (aparecendo para os trabalhadores como
protetor, ao contrário dos governos anteriores a 1930). Passava a controlar o
movimento através do Ministério do Trabalho, restringindo quase por completo
suas ações políticas.
Somente a
partir de 1945-46 o movimento operário voltaria a crescer, num clima de
relativa liberdade, proporcionado pela Constituição liberal que vigorou até
1964.

Destaca-se,
nesse crescimento do movimento operário, a criação, em 1962, do Comando Geral
dos Trabalhadores (CGT), que passou a comandar o movimento operário em nível
nacional. Outro movimento que se destaca são as Ligas Camponesas, surgidas em
1954, em Pernambuco, rapidamente se espalharam pelo Brasil e, em 1963, são
denominadas Ligas Camponesas do Brasil, cuja bandeira de luta era; “Reforma
agrária na lei e na marra”.
OS
MOVIMENTOS SOCIAIS E A CIDADANIA
Esse processo
de intensa participação, no entanto, foi interrompido com o golpe militar de
1964, que, a pretexto de livrar o país do “perigo comunista” e respaldando-se
no binômio ideológico “segurança e desenvolvimento”, restringiu a participação
popular através do bipartidarismo (Arena e MDB) e proibiu toda manifestação
popular que viesse atentar contra a “ordem pública”. Além do não-atendimento
das necessidades sociais elementares, demonstrado pelos altos índices de
analfabetismo, pela falta de habitação, pelas doenças endêmicas, pela falta de
saneamento, etc., o impedimento do livre exercício dos direitos políticos
tornava mais precária ainda a cidadania no Brasil.
Na Europa e
nos demais países do mundo capitalista desenvolvido, a acumulação monopolista
se fez graças à implementação do Estado do Bem-Estar Social, que, malgrado o
caráter alienante do consumo de massa, garantia à satisfação das necessidades
básicas da população, ou seja, os direitos de cidadania social.
No Brasil isso
não aconteceu. A acumulação se fez apoiada num governo militar e autoritário, a
partir de um modelo de desenvolvimento excludente, que beneficiou apenas as
classes empresariais ligadas aos monopólios. O que se viu foi um Estado de
Mal-Estar Social, com os problemas sociais agravados.
Em decorrência
desse processo, no Brasil, os movimentos sociais que ocorreram no início dos
anos 70 (salvo, evidentemente, a luta armada empreendida por grupos de
esquerda) tinham como objetivo a satisfação das necessidades mínimas de
sobrevivência da população pobre, como por exemplo, movimentos que lutavam por
creches, por habitação, transporte coletivos, por melhorias em favelas, por
postos de saúde, entre outros.
Devemos
ressaltar nesses movimentos a decisiva presença da Igreja Católica, que,
através de seu segmento progressista, vinculado à Teologia da Libertação,
garantiu um espaço de organização aos movimentos, inclusive dando abrigo e
ajudando na fuga de vários perseguidos políticos.
Dentre os
vários movimentos surgidos, alguns foram mais destacados pelas características
violentas, ou por sua importância no processo produtivo, por exemplo, Movimento
de Quebra-Quebra de Trens Suburbanos em São Paulo e Rio de Janeiro, entre 1974
e 1976; ou o Movimento do Custo de Vida, em 1973, que atingiu vários Estados e
levou, em 1978, um abaixo-assinado de um milhão e duzentas e cinquenta mil
assinaturas para o Presidente da República, reivindicando congelamento dos
preços e correção dos salários.
Todos esses
movimentos contribuíram para despertar a consciência dos problemas vividos e
possibilitaram a participação popular no processo de redemocratização do país.
Como resultado, reativa-se o movimento estudantil, no final dos anos 70, o
movimento operário reaparece com força, com as greves no ABCD paulista, em
1978, bem como a sua reorganização através das centrais sindicais (CUT e CGT) e
da articulação com os partidos, principalmente o Partido dos Trabalhadores
(PT).
Nos anos 80, a
importância dos movimentos sociais foi notável na campanha por eleições diretas
para presidente da República – as Diretas-já (1984-1985) – e na Constituinte de
1988, na qual verificaram avanços com relação aos direitos de cidadania por
influência dos movimentos sociais.
E, já nos anos
90, a deposição do então presidente, Fernando Collor de Mello, resultou de
intensas mobilizações em que se destacaram os estudantes – “os caras pintadas”
-, cujo objetivo, era o estabelecimento da ética na política.
No entanto, a
maioria dos problemas sociais permanece, alguns até agravados. Mas suas
soluções dependem certamente, da capacidade de a sociedade civil organizar-se
em movimentos sociais, de forma a consolidar e ampliar os direitos sociais e
políticos conquistados.
Reprodução para fins didáticos.
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